Parte do próprio PSOL tem. Nessa quarta-feira, treze de agosto, a direção estadual do PSOL, em atitude inacreditável, bloqueou a deputada do horário político eleitoral. E que parte do PSOL é essa?
Hoje, com a radicalização política, muitos conflitos são travados atrás dos balcões da institucionalidade. Partidos, sindicatos, redações, fervem entre o avanço do fascismo, o entreguismo, e a resistência.
Dentro do PSOL-RJ nós vemos uma dessas disputas de forma acirrada. Estrelas do partido como Marcelo Freixo, Jean Wyllys, e Chico Alencar estão em confronto constante com a deputada Janira Rocha. Esses parlamentares chegam a situações absurdas, como trabalhar pelo afastamento da deputada, em coro com o PMDB (apesar de todo o esforço da direção nacional do PSOL para protege-la e sua enorme base social).
Porque eles fazem isso? A resposta para esse tipo de questão sempre será subjetiva. A mim, como anarquista anti-sectário, que acompanha essa disputa de perto, porém de fora, me parece muito claro: Os parlamentares com base midiática (e não social) temem que a radicalização da deputada atrapalhe suas relações institucionais. A acusam de irresponsável por tomar atitudes corretas em momentos delicados. E fazem seus ataques com toda a desonestidade intelectual possível.
Janira Rocha não é professora universitária, mas no mundo real se situa bem à esquerda de Freixo e cia. Freixo usa o microfone e a retórica para exigir pureza ideológica que não possui. Não é questionado porque sua base são jornalistas de classe média, gente que detém meios de propaganda.Sua base são o Caetano Veloso e Wagner Moura. A base de Janira são catadores de lixo, operários ameaçados, e a periferia urbana no seu estado mais crítico. Os parlamentares midiáticos acusam a Janira de “práticas direitistas” dentro do PSOL, enquanto eles seriam os guardadores da ética esquerdista.
Mas lancemos um olhar aos fatos:
Durante a greve dos bombeiros, Janira Rocha, estava dentro do Quartel quando foram atacados pelo BOPE e presos. Foi fundamental na articulação da greve em nível nacional. Perseguida pela rede globo, ao invés de contar com a solidariedade de seus correligionários ouviu de Freixo que “aquilo não é função de uma parlamentar”
Durante as manifestações, Freixo e cia se afastaram o quanto puderam, foram subservientes à grande mídia, ajudaram a criminalizar anarquistas, inclusive atirando na fogueira Caio Silva e Fabio Raposo, desqualificaram publicamente a Elisa Quadros. (Na mesma ocasião Orlando Zaconne foi primoroso ao defender o direito de pensar além do capital) Janira Rocha estava na linha de frente, muitas vezes de forma física entre a polícia e manifestantes. Janira foi pessoalmente retirar da cadeia diversos detidos e mobilizou forças institucionais na defesa dos direitos civis dos manifestantes.
Quando Domingos Brazão e Cidinha Campos se enfrentaram, Freixo emitiu uma nota de solidariedade à Cidinha. Quando Janira deu carona para os perseguidos políticos no consulado uruguaio, e recebeu o quarto processo de cassação, Marcelo Freixo trabalhou para silenciar o partido.
Marcelo Freixo quer ser prefeito. E ninguém questiona, por exemplo, o fato de um candidato que se diz contra financiamento de empresas ter como um de seus principais financiadores na corrida pela prefeitura o Guilherme Leal, dono da Natura. É como se, caso o Cavendish, e não a Delta, doasse ao Cabral, isso passasse a ser ético. Quando o Freixo chama a Janira de “irresponsável” não é por se comportar de forma “direitista” mas por prejudicar as relações institucionais que podem leva-lo para prefeitura.
A diferença do Freixismo para o Lulo-petismo é que o Freixismo não sentou no trono. Pelo andar da carruagem não sentará. Assim como o PT dos anos 80, o PSOL reúne uma militância preciosa, e pode ser uma peça importante na contenção do fascismo institucional. É preciso que essa militância escape do culto a personalidade e dos erros que levaram o PT para onde está. E é preciso que o PSOL se unifique sob um paradigma realmente popular. A democracia burguesa está morrendo internacionalmente.
– Janira Rocha:
“Eu gostaria de começar pedindo a todos que deem um segundo de atenção ao que está acontecendo em Gaza. Não existe luta no mundo que possa resistir sem a solidariedade internacional, sem a solidariedade de classe. Nós não podemos nos acostumar em ver o que está acontecendo na Palestina. Do mesmo modo que não podemos nos acostumar a ver uma pessoa embaixo de uma ponte apodrecendo, não podemos nos acostumar com crianças cheirando cola e sendo espancadas pela polícia. Não podemos nos acostumar com o discurso de que bandido bom é bandido morto. Está tudo no mesmo nível. A nossa luta, a nossa militância, a nossa ação política deve ser grandiosa o suficiente para nos solidarizarmos com as crianças palestinas e, do mesmo modo, com as crianças no abrigo de Antares. Onde a prefeitura do Rio de Janeiro está fazendo um trabalho de limpeza social, pegando jovens dependentes químicos, tirando da cidade, e conduzindo à um abrigo que fica em Antares, que é controlado pelo tráfico, onde essas pessoas estão sendo mortas. E ninguém vai buscar essas pessoas. Ninguém vai reclamar essas pessoas. Nem em vida, nem em morte. Ali o tráfico está matando no atacado. Nós temos nossa Palestina aqui.
Nós temos várias palestinas aqui. Nós temos uma Palestina dentro do complexo petroquímico do COMPERJ, onde trabalhadores vivem em situação análoga à escravidão. Nós temos nossa Palestina dentro da Polícia Militar, onde trabalhadores da polícia são obrigados a trabalhar por 19 horas, para dormir em alojamentos que não existem, dormem em papelão. Aqueles homens fortes, que estão nas nossas passeatas, com suas bombas, seus fuzis, seus cassetetes, dando pancada na nossa cabeça, prendendo gente, com aquela violência, com aquela truculência, estão comendo comida podre dentro do quartel. Hoje existem mais 80 praças a quatro semanas em cárcere privado dentro do CFAP (centro de formação e aperfeiçoamento de praças). São esses trabalhadores brutalizados que nos brutalizam enquanto nós protestamos.
E nós precisamos nos manifestar porque agora temos a seguinte tarefa : destruir essa democracia burguesa. Essa democracia que se vende como moderna, capaz de realizar grandes investimentos, grandes jogos, mostrar uma cara maravilhosa ao exterior enquanto ao público interno abre espaços de exceção para nos agredir. E não ataca somente os black blocs. Não ataca somente os setores de opinião de classe média. Não ataca somente os bombeiros. Ataca todos aqueles que ousarem lutar contra o plano de poder que está estabelecido. Seja até algum setor burguês… Se entrar em uma de lutar contra a ordem estabelecida, eles partem para cima com toda a violência. A criminalização que nós estamos vivendo não é contra um determinado grupo social, ela é uma criminalização de interesses de classe. É uma criminalização com interesses profundos na manutenção da exploração e da opressão
Não somos socialistas do debate teórico (embora não desprezemos a teoria, sabemos que temos que estudar e gostamos de estudar). Mas somos os socialistas de campo, que estamos nas madrugadas em barricadas de trabalhador do comperj, que fazemos vistorias em hospitais públicos onde nossa classe está sendo assassinada, que vamos assistir a nossa juventude presa política dentro do complexo de Bangu, que estamos dentro de Antares tentando organizar o povo pobre para impedir o genocídio dos jovens dependentes químicos, que estamos nas greves, nas comunidades vendo pobres levando tiro na testa, tiro no peito. Para nós, como socialistas, não existe campo determinado. Não existe socialista de chão de fábrica, socialista do campo da cultura, etc. Para nós o socialista é assim do momento em que acorda, até ir dormir. Ele respira a necessidade de justiça, de mudança, de revolução, de igualdade.
Nós precisamos prestar atenção no período em que estamos vivendo. Nós temos outras tarefas conduzidas por esse período. Nós precisamos desmascarar essa democracia burguesa que está vindo para cima da gente. Precisamos deixar cair os véus. Precisamos nos unificar. Inclusive com quem não quer se unificar conosco. Hoje nós precisamos nos unificar com os policiais militares que são trabalhadores sofrendo situação de extrema vulnerabilidade e mostrar para eles o quanto eles estão errados. O quanto eles combatem do lado errado. Mostrar para eles como eles vão ter que montar seus próprios organismos, seus sindicatos, CLANDESTINOS, para enfrentar a opressão que sofrem dessa democracia burguesa. Mostrar que eles precisam vir para o lado de cá. Nós vamos precisar nos unificar aos anarquistas, que estão na linha de frente das ruas, lutando. Não importa que eles não votem. É obrigação nossa não permitir que criminalizem os black blocs. É obrigação nossa não permitir que criminalizem os anarquistas. É obrigação nossa não deixar que a Rede Globo ganhe esse debate. Porque nenhum debate que vem da Rede Globo, seja no Jornal Nacional, ou seja subliminarmente através de suas novelas, nos interessa. Os debates que nos interessam são os nossos debates. Os nossos debates de classe. Independente dos nossos partidos, independente do posicionamento ideológico, a nossa classe tem cheiro. E é a serviço disso que nos organizamos dentro do PSOL. Somente a serviço disso, porque inclusive nós não temos muita identidade com muita coisa que acontece dentro do PSOL. Mas nós entendemos o PSOL como um espaço importante de organização para que a gente possa fazer não só a política direta, mas também a política institucional, que nós entendemos meramente como instrumento para melhor nos colocar a frente das lutas da nossa classe. Nós iremos nos organizar dentro do PSOL da mesma maneira que muitos de nós nos organizamos nos sindicatos, da mesma maneira que muitos de nós não nos organizamos em organismo nenhum mas temos uma ação pessoal, individual, consciente e revolucionária. Nós estamos nesse momento podendo nos unificar em luta.
O que é importante para nós nesse processo eleitoral que estamos vivendo? É chamar as pessoas a confiar na democracia burguesa? Chamar as pessoas a confiar no parlamento? Não! O bom parlamentar entra no parlamento dizendo que aquele parlamento não merece confiança, que aquilo não é uma casa do povo, que dali não sairá nada. Nenhuma assembléia legislativa, nenhuma câmara, nenhum congresso nacional, nenhum organismo desses tem a capacidade de produzir nada a favor do povo. A não ser que do lado de fora exista uma pressão forte o suficiente para impor, de fora para dentro, a necessidade de uma política específica voltada para as necessidades do povo. Nós temos que dizer para os camaradas de Antares, de Nilópolis, de São Gonçalo, para todos os camaradas que estão lutando ao nosso lado que nós vamos ao parlamento para destruí-lo. E não vamos ao parlamento para compor com ele. A primeira missão de um parlamentar do povo é saber o que ele tem que destruir e o que ele tem que construir. Que tipo de instrumento é esse. Para que serve esse instrumento. Nós dizemos: não votem em nós, se não estiverem dispostos a continuar com a gente. Não votem em nós se não estiverem dispostos a tomar os nossos mandatos e usar como trincheiras para destruir essa democracia burguesa, para lutar pelos direitos que são fundamentais ao nosso povo. Tenho muito orgulho do mandato que exercemos. Não conheço na história do parlamento fluminense outro caso de alguém que tenha tido quatro processos de cassação em quatro anos. Quero dizer que gostaria de ser reeleita, e ter mais processos de cassação, e em cada um deles fazer uma discussão qualificada sobre qual é o papel daquele parlamento. Não foi fácil passar por todo esse processo, por mais que eu fale com tranqüilidade sobre ele. Foi doloroso. Porém, ao chegar do outro lado, eu saí fortalecida, com mais convicção na nossa luta. Quero chamar o povo a ação com a gente. Quero dar muita carona. Toda vez que houver alguém sofrendo injustiça em algum lugar, nós vamos dar carona. Aquele carro já carregou bombeiro, já tirou gente de dentro da favela, já levou operário do COMPERJ ameaçado por capanga. Qualquer carro que estiver na nossa mão vai ser usado desse modo. Em qualquer política que nós estejamos construindo, sempre estaremos do lado daqueles que estão sendo caçados por essa ordem burguesa maldita. ”